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Slavifici Doloris



1)      Conforme a Slavifici Doloris do Papa João Paulo II, qual o sentido cristão do sofrimento humano?
 
O sofrimento é algo mais amplo e mais complexo do que a doença e, ao mesmo tempo, algo mais profundamente enraizado na própria humanidade. No âmago daquilo que constitui a forma psicológica do sofrimento encontra-se sempre uma experiência do mal, por motivo do qual o homem sofre. Por conseguinte, no conceito cristão, a realidade do sofrimento explica-se por meio do mal que de certa maneira, está sempre em referência a um bem. Assim, embora o mundo do sofrimento exista na dispersão, contém em si, um singular desafio à comunhão e à solidariedade.
A Sagrada Escritura é um grande livro do sofrimento. Vários são os relatos de momentos difíceis, conflitos, infidelidades, doenças. Vemos, nisso, que o sofrimento pode ter também o caráter de prova, como no caso de Jó. Ele deve servir à conversão, à reconstrução do bem no sujeito pela misericórdia e amor de Deus. Nesse sentido, é Cristo que nos introduz no mistério e ajuda-nos a descobrir o “porquê” do sofrimento. Esse só pode ser entendido à luz do amor de Deus que envia o seu Filho único ao mundo e Ele sofre por amor. A salvação é essa libertação do sofrimento, do mal pelo amor que salva mediante o sofrimento. Tal é o amor pelo homem, pelo mundo: é o amor salvífico. O amor que leva a entregar-se à Cruz, aos padecimentos da carne, às dores. É o amor. É a dimensão da Redenção, sem a qual não se entenderia a loucura de Deus de fazer-se no meio dos homens. Por isso, o que ilumina o sentido do sofrimento é também o que diz Jó: “Sei, de fato, que o meu Redentor vive e que no último dia verei o meu Deus” (Jó 19, 25-26). Deus dá o seu Unigênito para que o mundo não pereça, mas tenha a vida. O homem perece quando perde a vida eterna. O contrário da salvação é, portanto, o sofrimento definitivo.
O sofrimento humano só tem sentido olhando para o sofrimento do Salvador e vislumbrando nele a glória definitiva, uma luz nova, um desejo de vida e santidade eternas. Cristo tornou-se incessantemente próximo do mundo do sofrimento humano, mas uma proximidade que salva que redime, que aponta para a grande esperança: estar em plena comunhão com Deus. É por meio do sofrimento que o próprio Cristo faz com que também nós nos tornemos conscientes da sua força salvífica. É na profundidade do sofrimento assumido pelo Cristo que o ser humano olha para o seu sofrimento e une-o ao do próprio Senhor e oferece-o como reparação de suas faltas, vitória sobre o mal, sobre o pecado e purificação para estar junto de Deus. Sofrer é, também, estar aberto a ação das forças salvíficas de Deus em Cristo.
Apesar de sofrer como homem, Cristo, Deus de Deus, redime todo o sofrimento do mundo na cruz. Nela devemos também propor-nos a pergunta sobre o sentido do sofrimento e ler aí, até o fim, a resposta a tal pergunta. A cruz não é a palavra final!
 
2)      Que relação podemos fazer entre esse documento e o Sacramento da Unção dos Enfermos?
 
O sacramento da Unção dos Enfermos é também chamado de sacramento da Cura. Na Carta Apostólica Salvificis Doloris João Paulo II faz questão de ressaltar que “[...] no sofrimento se esconde uma força que aproxima interiormente o homem de Cristo, uma graça particular” (n. 26). O sacramento da Unção dos Enfermos é esse meio da ação de Deus para levar o ser humano à abertura à ação de Deus, a abrir-se para a novidade de Deus, tornando-se também pessoa nova, curada.
Acolher esse sacramento é sinal de maturidade e de grandeza espiritual, como é acolher e suportar as situações de sofrimento. A consciência da necessidade do sacramento pode manifestar que a pessoa transforma a sensação deprimente de sofrer em alegria, em vista da união aos sofrimentos do Senhor e para a salvação dos irmãos e irmãs. Para acolher o sacramento é necessária a fé, mas para acolher o sofrimento também é preciso fé, para entender sua dimensão redentora, salvífica e conformar-se.
Além disso, a enfermidade sempre foi considerada como culpa, como desgraça, como sofrimento humano. São sofrimentos físicos, espirituais, perversão do coração. Nisso o sacramento da Unção dos Enfermos está estritamente ligado com a Carta Apostólica porque parte da mesma realidade: o sofrimento, o mal que atormenta o homem. Interessante que também a cura é sinal de convergência, porque como aponta João Paulo II que a redenção é dada por Cristo e nele todo sofrimento adquire sentido; na teologia do sacramento a cura é vista como dispensação benevolente de Deus. É ele que envia o socorro, o auxílio (Eclo 38, 8).
Assim como Jesus salva amando, mas encarando o sofrimento humano, no sacramento é Ele mesmo que salva tocando nos enfermos e curando-os (Mc 1 31; Mc 1 , 41). Jesus atinge pelo sinal sacramental a cada homem e mulher como os atingi a cada um pela cruz. Ele é próximo do ser humano no momento do desespero, da dificuldade, do desânimo, da fraqueza. Como no sofrimento, no sacramento, é o Cristo mesmo que vai ao encontro ungir, curar (Mc 6, 12s).
Assim como todo batizado foi banhado no sangue e na água que jorraram do lado do Senhor na cruz, no sacramento cada batizado é ungido com o óleo santo que restaura as forças espirituais e corporais. O ato sacramental é sempre a esperança de estar totalmente integrado ao Senhor, participante da sua glória e da comunhão que une a todos os crentes. Assim como o mundo do sofrimento almeja outro mundo, o do amor humano, o sacramento da Unção dos Enfermos faz vislumbrar esse novo mundo: o conforto no Senhor, a esperança na sua Palavra.
Por detrás de todo sofrimento humano, está o próprio sofrimento de Cristo e essa presença próxima é realçada e confirmada no sacramento da Unção. Nele o Senhor mesmo se compadece e une-se a cada enfermo e dá-lhe a graça da cura espiritual, da salvação.

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