1. INTRODUÇÃO
Mas de onde vieram?
Quantos eram? Quais eram seus costumes? Tinham religião? Todas essas
inquietações motivaram a pesquisa que culminou na elaboração desse pequeno e
modesto texto.
Para que o objetivo
seja alcançado, o texto está distribuído em pequenos tópicos que apresentam o
resultado da investigação. Começa-se por dar uma definição da palavra “índio”,
bem como da sua aplicação aos povos autóctones do Brasil. Em seguida apresentam-se
os índios do Brasil: quem são de onde vieram.
Em seguida, aparece as
características, costumes e cultura dos povos indígenas brasileiros e,
posteriormente, a exploração e escravidão indígena por parte dos colonizadores
portugueses e de seus interesses financeiros. Já finalizando a pesquisa, há um
tópico que discorre sobre a relação da Igreja com os índios, onde desponta a
figura do Apóstolo do Brasil, São José de Anchieta.
Finalmente, o trabalho
é encerrado com a relação da Igreja do Paraná e os índios. Nesse item é
destacada a presença de Frei Timóteo de Castelnuovo que viveu com vários povos
indígenas no Aldeamento São Pedro de Alcântara, hoje a cidade de Jataizinho,
chamado “norte velho” do Paraná, Diocese de Cornélio Procópio.
Ao leitor, fica o
convite a mergulhar na história dos “descobridores” do Brasil, os denominados
“sem alma”, inferior aos homens, mas que são os verdadeiros proprietários desta
Terra de Santa Cruz!
2. PRESENÇA INDÍGENA NO BRASIL NO
INÍCIO DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA
Segundo o Dicionário
Aurélio, os índios são indivíduos pertencentes a qualquer um dos povos
aborígenes das Américas[1]. A
designação “índio” deriva de Cristóvão Colombo quando ao encontrar o Novo
Mundo, chamou seus habitantes de “índios” pensando ter chegado à Índia[2]. É
um dos equívocos mais sagrados de nossa história. “O almirante usou o termo
pela primeira vez, segundo o famoso Padre Bartolomeu de Las Casas, ao comentar
uma visita que recebeu do comandante de uma das naus, a Pinta, o capitão pero
Martin Alonso Pinzón, a quem enviara três ‘índios’”[3].
Quando os europeus
chegaram à terra que viria a ser o Brasil, encontraram uma população ameríndia
bastante homogênea em termos culturais e linguísticos. De onde vieram? Os estudos
modernos coincidem na atribuição de uma origem comum a todos os povos da
América. Provavelmente eles pertencem ao grupo racial xantodermo, mas há grande
variedade de tipos físicos. Procedentes do nordeste da Ásia, a partir de 40.000
a.C. atravessaram o estreito de Behring[4] e
povoaram o continente americano com sucessivas ondas migratórias[5].
Essa população autóctone foi quase dizimada pelos conquistadores europeus.
2.1.
OS ÍNDIOS DO BRASIL: QUEM SÃO? DE ONDE SÃO? QUANTOS SÃO?
“Então
lançamos fora os bateis e esquifes. E logo vieram todos os capitães das naus a
esta nau do Capitão-mor. E ali falaram. E o Capitão mandou em terra a Nicolau
Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele começou a ir-se para lá, acudiram
pela praia homens aos dois e aos três, de maneira que, quando o batel chegou à
boca do rio, já lá estavam dezoito ou vinte”. (Pero
Vaz de Caminha)
Em 1498, Vasco da Gama
realizou a maior façanha da navegação portuguesa: alcançou Calicute, na Índia,
contornando a África. Para consolidar o domínio do novo caminho, os portugueses
organizaram rapidamente novas expedições.
Sob o comando de Pedro
Álvares Cabral, uma nova e suntuosa expedição partiu de Lisboa no dia 9 de
março de 1500 com treze navios e cerca de 1500 homens. Mas, em 22 de abril a
esquadra aportou em novo e estranho lugar[6].
Chamaram as novas terrar de “Ilha de Vera Cruz”, nome mudado no ano seguinte
para “Terra de Santa Cruz” e, a partir de 1503, para “Terra do Brasil”, chamada
também por longo tempo de “Terra dos Papagaios”[7].
À época do achamento do
Brasil, encontraram aqui nativos que, à primeira vista, foram muito cordiais.
De acordo com Pero Vaz de Caminha[8]: “[...]
avistamos homens que andavam pela praia, uns sete ou oito, segundo disseram os
navios pequenos que chegaram primeiro”[9]. [10]
Calcula-se que havia
cerca de 1 milhão de índios no brasil[11].
Outros dizem quem em 1500 estima-se que tinha cerca de 5 e 6 milhões de índios
no Brasil[12].
Atualmente a FUNAI (Fundação Nacional do Índio) calcula que a população
indígena seja de 896 mil pessoas (incluindo aqueles que se declaram índios por
raça, cor, que se consideram indígenas e que moram ou não em áreas indígenas)[13].
De 1500 até a década de
1970, a população indígena decresceu consideravelmente e muitos povos foram
extintos. Esse desaparecimento, entretanto, passou a ser visto como contingência
histórica apenas lamentável. Essa situação começou a mudar no século passado
quando os povos indígenas foram incluídos no censo demográfico nacional pelo
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas)[14].
Com isso, a população
indígena brasileira tem sido mais valorizada e seus direitos tem sido
garantidos. No entanto, é de perceber a grande diferença populacional em 500
anos. De 6 milhões para menos de 1 milhão[15].
Povos e povos indígenas desapareceram da face da terra como consequência do
encontro do Antigo e do Novo Mundo, da ganância e da ambição, formas culturais
da expansão do que se convencionou chamar o capitalismo mercantil[16].
Mas quem eram esses
habitantes autóctones? Formavam uma população heterogênea divididos em vários
povos: tupinambás, potiguares, guaranis etc. Falavam línguas diferentes e
tinham costumes diferentes. As primeiras notícias que chegaram à Europa sobre
estes povos vinham através de viajantes, naufrágos e missionários que viveram
em aldeias litorâneas.
Os relatos
generalizavam os traços culturais e, durante muito tempo, os índios foram
considerados todos iguais. Mas não era assim. Cada povo era formado por
diversas tribos que falavam a mesma língua, mantinham os mesmos costumes e
estavam ligadas por fortes traços culturais. Nas aldeias em que viviam, as
habitações eram geralmente organizadas em forma de círculo. Algumas tribos
contavam com uma única habitação coletiva[17].
Não utilizavam metais,
mas praticavam a agricultura, a pesca e a cerâmica. Conheciam o fogo e teciam
fibras vegetais. Pertenciam a cinco grandes grupos linguísticos e a pequenos
grupos que viviam isolados: os Tupi-Guarani (vivam longe da costa), os Jês
(viviam nos planaltos Central e Meridional e próximos ao litoral no Espírito
Santo e na região fluminense de Campos), os Aruák (Amazônia ocidental,
fabricantes de cerâmica marajoara), os Karíb (da Amazônia setentrional até as
Antilhas ou mar das Caraíbas), os karirí (do sertão do Nordeste que se
adaptaram à vida do pastoreio e desapareceram pela miscigenação), os Panos e os
Tukâno (vivem ainda hoje em áreas pouco acessíveis da Amazônia)[18].
Os índios brasileiros
da costa foram logo dizimados pelas doenças adquiridas no contato com os
brancos europeus, pela escravidão a que foram submetidos e pelas guerras,
massacres e violência para com eles. Os que fugira para o interior, foram
mortos física ou culturalmente pela expansão colonial a partir do século XVII. Atualmente
no Brasil, existem cerca de 100 mil indivíduos (alguns dizem até 200 mil) divididos
em 206 grupos[19].
Dessa população indígena, 27% de mantêm isolados da sociedade brasileira, 14%
em contato intermitente, 23% em contato permanente e 36% se encontram
integrados à população.
2.2.
SUAS CARACTERÍSTICAS, COSTUMES, CULTURA
“Pardos,
nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos,
e suas setas”.[20]
2.2.1. Vida
e costumes
De maneiras diferentes,
os índios habitam o território brasileiro garantindo sua sobrevivência nos
recursos naturais oferecidos pelo meio ambiente. Em geral, caçam, pescam,
coletam, plantam e produzem os instrumentos necessários para estas atividades.
A terra pertence a todos os membros do grupo e cada um tira dela o seu próprio
sustento.
Existe, na cultura
indígena, uma divisão do trabalho por idade ou por sexo: cabe à mulher o
cuidado da casa, das crianças e das roças. O homem é responsável pela defesa,
pela caça e pela colheita dos alimentos na natureza. A caça, único meio que
possuem de obter carne, pode ser individual ou coletiva.
Além de um conhecimento
profundo da vida e dos hábitos animais, os índios possuem técnicas que variam
de povo para povo. Com a chegada da civilização europeia, foram introduzidas a
arma de fogo e o cão, que para os índios é muito querido como animal de
estimação[21].
Na pesca, é comum o uso de substâncias vegetais que intoxicam e atordoam os
peixes, tornando-os presas fáceis.
A maioria dos índios do
Brasil pratica a agricultura segundo uma técnica, a coivara[22],
idêntica à de outras populações que habitam a região tropical[23].
2.2.2. Organização
Os índios vivem em
aldeias que constituem unidades independentes. A forma das aldeias varia
conforme o povo indígena e seus costumes. No achamento do Brasil haviam
inúmeras tribos na terra brasileira, mas infelizmente grande parte foi dizimada
e hoje existem tribos que se reduzem a uma única aldeia.
As casas também
diferem. Geralmente eram habitadas ou por uma família extensa que compreende
várias famílias. São feitas com estacas fincadas no chão e recobertas com
folhas de palmeiras. É muito comum os povos se dividirem em duas metades. Os
casamentos se fazem sempre entre indivíduos de metades diferentes. As crianças
quando nascem passam a pertencer a uma das metades[24].
2.2.3. Ritos
e mitos
Quando os portugueses
chegaram ao Brasil, colonizaram e converteram muitos índios ao catolicismo,
inclusive desrespeitando suas crenças e costumes. O fato é que os povo
indígenas têm sua cultura e muitas tribos possuem seus ritos de culto às suas
divindades. Há ritos de passagem, por exemplo, em que uma pessoa passa de uma
situação para outra. São ritos que se ligam à gestação e ao nascimento, ao
casamento ou à morte, dentre outras.
2.2.4. Arte
Na cultura indígena a
arte não é uma atividade separada, individualizada. Ela se mistura à via
cotidiana e suas manifestações se encontram ligadas aos objetos utilitários ou
a elementos rituais. A pintura corporal, trabalhos em madeira, a pintura e o
desenho indígenas, os cestos, alguns a cerâmica, todos são sinal de crenças, de
pertença a um povo e a uma cultura.
Caminha, descreve bem
alguns resultados da arte indígena: “Davam-nos daqueles arcos e setas em troca
de sombreiros e carapuças de linho, e de qualquer coisa que a gente lhes queria
dar”, ou então, “e andavam lá outros, quartejados de cores, a saber metade
deles da sua própria cor, e metade de tintura preta, um tanto azulada; e outros
quartejados d’escaques”[25].
2.3.
A EXPLORAÇÃO E ESCRAVIDÃO INDÍGENA
A descoberta do Brasil
não foi seguida pela ocupação da terra. A colônia só apareceu no quarto decênio
depois da tomada de posse pelos europeus. O interesse dos portugueses na
América era estabelecer contatos comerciais com os povos dos países e continentes
descobertos. Mas em comparação com a Índia, o Brasil ofereceu poucas
possibilidades ao espírito mercantil.
O nível cultural
inferior dos indígenas, as condições geográficas e climáticas e a falta de
metais preciosos cooperaram em um sentido desfavorável à troca de mercadorias. Essas
circunstâncias esclarecem o pouco interesse nas novas terras da América durante
os primeiros decênios do século XVI[26].
Durante este período o
domínio português manteve-se na construção de feitorias (isso porque a extração
do pau-brasil demandava um comportamento nômade: os exploradores deslocavam-se
pelas matas litorâneas à medida que a madeira ia-se esgotando. Por isso essa
atividade não deu origem a núcleos significativos de povoamento[27]) que
sustentavam o comércio com os indígenas. Era o interesse, sobretudo, no
pau-brasil, único artigo comercial significativo. No entanto, o comércio do
pau-brasil ganhou rapidamente importância. Essa mercadoria era vista na Europa
como lucrativa. Então a coroa portuguesa tratou logo de assegurar o monopólio
da madeira e concedeu os direitos de exploração aos comerciantes.
Os métodos comerciais
dependeram totalmente das condições da nova terra descoberta. Assim, os
comerciantes ficaram na dependência do trabalho dos indígenas. A procura do
lugar apropriado para a extração do pau-brasil, a derrubada, o transporte e a
carga eram possível somente com sua ajuda. A falta de animais, fez dos índios o
meio auxiliar para tal serviço. Em troca recebiam simples objetos, usados e
velhos, vindos de Portugal[28] –
o escambo[29].
Entretanto, embora os
indígenas ofereceram gratuitamente seus serviços, com o passar do tempo ficaram
mais exigentes, afinal “[...] só com grande dificuldade podia obter pau-brasil,
porque os índios só realizavam o seu trabalho a contra-gosto e exigiam grandes
recompensas”[30].
O sistema era posto então em perigo. Os portugueses atraíram, em pouco tempo, a
inimizade de várias tribos. Como consequência disso, a coroa começou a dar
prescrições sobre o trato com os indígenas brasileiros.
A primeira medida foi
tomada pela expedição do navio “Bretoa” que continha ordens explícitas do rei
português D. Manuel I condenado aqueles que ofendesses ou causasse prejuízo aos
indígenas[31].
Não era bondade da coroa portuguesa, mas uma medida esperta de ter os índios a
seu lado. Mas os franceses também estavam se interessando na mercadoria do
Brasil. Isso foi alvo de muitas lutas entre as duas coroas. Afinal, não haviam
“donos do Brasil” morando aqui e cuidando das fronteiras. Finalmente, João III
reconheceu que o único caminho para a preservação do Brasil se encontrava na
ocupação. Sendo assim, a expedição de Matim Afonso de Souza (1530-1533)
conduziu à tomada de posse definitiva do país.
Embora a preocupação de
manter os indígenas do lado da coroa, a tradição da expansão portuguesa, no
século XV, o comércio de escravos foi praticado no Brasil desde o começo. A
coroa foi concedendo, cada vez mais frequentemente a pessoas particulares uma
licença para o comércio de escravos índios. Milhares de índios devem ter sido
escravizados e enviados à Europa. O grande destino eram as Antilhas. Lá, o
extermínio total da população originária levara à necessidade de mão-de-obra.
Dom João III
transportou ao Brasil o sistema de doações feudais, as capitanias. O Brasil foi
dividido em longas faixas de terra , inicialmente 15, em que crescia a expansão
do território e também o cultivo da cana-de-açúcar. As fazendas e os engenhos
criaram as condições de permanecer na colônia. Mas o número dos imigrantes
brancos era insuficiente para a colonização e para o trabalho. Em 1570 viviam
no Brasil cerca de 20 a 25 mil homens brancos[32].
Consequentemente, a construção econômica da colônia brasileira teve que ser
suportada pelo trabalho dos indígenas.
Já antes da ocupação da
terra os colonos portugueses e franceses serviram-se da mão-de-obra indígena
mediante o escambo. Mas com a cultura da cana-de-açúcar os índios não eram mais
tão disponíveis. Não estavam acostumados ao nível pesado do trabalho dos
civilizados. Os ocupantes viram, então, no trabalho forçado dos índios, a
solução para firmar-se e enriquecer-se economicamente. A justificativa era que
somente o trabalho forçado os faria sair do seu modo natural de vida que
denominava-se como vadiagem, preguiça para familiarizá-los com a civilização
europeia.
Os escravos índios eram
negociados, vendidos ou presenteados como objetos. O número era muito variável
nas diversas regiões do Brasil. Mas, aos poucos, o trabalho forçado
demostrou-se um meio inadequado para civilizar os índios e para induzi-los à
realização de tarefas pacíficas. Muitos foram mortos nas plantações, nos
trabalhos forçados porque esse ritmo era incompatível com o seu modo de vida de
até então. O trabalho nas plantações chocava contra o caráter do índio. “O
marcado senso de liberdade do homem natural opunha-se à apropriação do ambiente
de uma fazenda. O seu monótono ritmo de vida e de trabalho encontrava-se em
contraste com a vida nômade da natureza selvagem[33]”[34].
Os índios foram vítimas
da violência à sua dignidade e da perda da liberdade. A escravidão indígena tem
seu início por volta do ano 1534 e vai até 1755. O fim dessa escravidão se deu
pelas leis de 1755 e 1758 por iniciativa do marquês de Pombal. Primeiro a lei
de 6 de junho de 1755 que foi válida inicialmente para os Estados do Grão Pará
e do Maranhão. Depois em 1758 a lei foi ampliada, por alvará, para todo o
território brasileiro[35].
2.4.
A IGREJA E OS ÍNDIOS
“Neste
ilhéu, onde fomos ouvir missa e sermão [...]”.[36]
O povo indígena era,
até então, desconhecido pelo mundo da época. Apenas chegando à América que se
teve notícia desses numerosos povos. Para a sociedade contemporânea, os índios
eram animais. Não tinham nem alma. Somente com a bula do Papa Paulo III “In Nomine Sancte” de 1537 sobre a
evangelização[37]
é que a Igreja vai reconhecer os índios como homens com alma.
A partir dessa bula
fica estabelecido como devem se administrar os sacramentos para esses novos
convertidos ao cristianismo, sobretudo sobre o batismo e o matrimônio. Nesse
processo todo de colonização os índios sofreram muito nas mãos dos portugueses,
espanhóis, franceses. Mas “não se pode negar que os missionários católicos
tenham cuidado dos índios”[38].
A Igreja teve papel decisivo na defesa dos povos indígenas desde o achamento do
Brasil. Evidentemente não faltaram clérigos que também defenderam as ideias de
que os índios eram inferiores aos humanos, mas houvera expoentes da fé católica
que lutaram pelos direitos indígenas até o próprio martírio.
Para proteger os
índios, os missionários organizavam aldeamentos que excluíam os colonos. Desde
o final do século XVI os jesuítas criaram no Uruguai, Paraguai e Brasil as
“reduções”[39]
que agrupavam até 100 mil autóctones[40]. Como
a língua era a dificuldade da comunicação os próprios padres aprendiam a língua
dos nativos e elaboravam catecismos para apresentarem a fé aos mesmos.
O próprio Papa Bento
XIV em 1741 escreveu a bula “Imensa
Pastorum” onde defendia direitos indígenas. Condenava todos aqueles que
tiverem ousado fazer escravos os índios, transportá-los para longe de suas
terras e privá-los de alguma forma de liberdade[41].
No Brasil, merece destaque José de Anchieta[42],
cognominado “Apóstolo do Brasil” e beatificado pelo Papa Francisco em 3 de
abril de 2014.
São José de Anchieta
foi autor da primeira gramática da língua Tupi e um dos primeiros autores da
literatura brasileira. Em 1533, com apenas 20 anos, é enviado ao Brasil onde
começa seus trabalhos de catequese dos indígenas na capitania de São Vicente
(hoje a cidade de São Paulo), quer pregando-lhes a religião diretamente, quer
escrevendo autos, peças teatrais e outros.
Em 1554 funda o colégio
de São Paulo, o terceiro colégio regular do Brasil. Foi um dos grandes mestres
e quase o único. Encarregou-se de ensinar latim, castelhano, doutrina cristã e
até a língua brasílica. A ele se deve a edificação da cidade de São Paulo. Em
1567 ajudou Estácio de Sá a expulsar os franceses do Rio de Janeiro, em 1578
foi eleito provincial do Brasil. Em 1585 pediu a dispensa do cargo de
provincial e passou seus últimos dias na aldeia fundada por ele, Reritiba.
Passou 40 anos no Brasil convivendo com os povos autóctones. Estes o chamavam
de pagé-guaçu (padre grande), os
portugueses davam-lhe o título de santo[43].
2.5.A
IGREJA DO PARANÁ E OS ÍNDIOS
Na realidade paranaense
a presença indígena também é realidade. Segundo pesquisas de Frei Adelino
Frigo, “[...] orçava-se em 10.000 o número dos selvagens contido no território
inculto da nossa Província”[44].
Outra fonte pesquisada pelo mesmo autor afirma: “Em estado de completa
selvageria, errantes pelas matas, pode-se calcular em mais de 40.000 das tribos
Gayuás, Guaranys, Coroados e Botocudos, além de outros de pequenas tribos pouco
conhecidas”[45].
A relação da Igreja com
os nativos que aqui se encontravam não é possível ser estabelecida sem a menção
ao grande missionário capuchinho Frei de Castelnuovo[46]. Frei
Timóteo nasceu em Castelnuovo Magra a 6 de fevereiro de 1823. Partiu para o
Brasil no fim de 1850. Após alguns trabalhos no Rio de Janeiro e em São Paulo,
Frei Timóteo chegou ao Paraná em 6 de dezembro de 1854 em companhia de Frei
Matias de Gênova.
Quando esses dois freis
chegaram a Jataí (Paraná) já haviam aqui um grupo de índios recolhidos das
selvas por ordem do Barão de Antonina. Frei Timóteo passou a dedicar a sua vida
à catequese dos índios enquanto Frei Matias foi encarregado do atendimento à
população branca.
Frei Timóteo foi
encarregado de fundar o aldeamento São Pedro de Alcântara (em Jataí), como ele
mesmo afirma: “No mesmo ano de 1855, aos 25 de março, eu, freti Timóteo de
Castelnuovo, missionário apostólico capuchinho, escolhi este lugar, para fundar
o supradito aldeamento conforme as instruções recebidas do Exmo. Senhor, o
Senador Barão de Antonina [...]”[47].
Nesse aldeamento haviam cerca de 11casas cobertas de telhas, inclusive a
destinada à celebração do culto divino. Havia nele também uma ferraria e uma
olaria, alguns índios, porém, moravam em ranchos cobertos de palha[48].
Quanto ao número de
pessoas, há registros de que em 1876 haviam 1.487 pessoas assim distribuídas:
“brasileiros e estrangeiros - 124; índios coroados – 902; índios caiuás – 461”[49].
Em 1893, no último recenseamento realizado no aldeamento, já no período
republicano, existiam: “índios coroados – 247; índios caiuás e guaranis – 884;
de origem europeia e africana – 184”[50].
Muitos foram os
problemas enfrentados por Frei Timóteo para ajudar os índios paranaenses.
Contratempos, intempéries no clima, secas, muitas chuvas, pássaros que
dizimavam a colheita, irredutibilidade dos índios, incompreensão do poder
central do Brasil, dentre outros. Aos poucos o trabalho foi ficando penoso e
Frei Timóteo via suas forças sucumbirem. Segundo relatos, Frei Timóteo formava
um indiozinho padre. Esse seu seminarista morreu à sua vista numa travessia do
rio Tibagi. Dizem que após esse fato Frei Timóteo, desgostoso, começou a
morrer”[51].
Frei Timóteo morreu aos
18 de maio de 1895 em São Pedro de Alcântara rodeado pelos seus índios e
amigos. Conhecido como o “velho cacique do Tibagi” viveu quarenta anos de
dedicação aos povo indígenas do norte do Paraná. Morreu nos braços de um velho
negro. Chamado carinhosamente pelos caiúas de “ciramoin” (meu avô) e pelos
caingangues “o nosso Pandaré Kufá” (nosso velho padre”[52].
3. CONCLUSÃO
Em abril de 1500 a
expedição de Pedro Álvares Cabral chegava ao Brasil. No mesmo mês, no dia 26 era
rezada a primeira Missa nessa nova terra descoberta. Quem eram os expectadores,
a assembleia? Um bocado de portugueses e uma multidão de índios. São animais?
Homens? Tem dignidade? Tem alma?
Crê-se que essas
perguntas foram respondidas ao longo do texto que ora se apresentou. Diante do
grande número de aborígenes que aqui se encontravam no século XVI vê-se uma
decadência enorme desse número ao longo da história brasileira. Muitos são os
fatores, mas certamente os maus tratos, a exploração, o trabalho, a invasão da
cultura, dentre outras coisas são causas sérias da extinção de diversas nações
indígenas.
Esses índios têm sua
cultura, seus costumes, sua crença e maneira de ser. Foram invadidos
desrespeitados pelos que vieram de fora e roubaram-lhes sua terra, liberdade,
sua natureza. Foram escravizados, explorados e enganados, mas souberam
resistir, mesmo a duras penas. A Igreja? Evidentemente não poucos religiosos e
teólogos investiram contra os povos indígenas, mas intrépidos missionários e o
Magistério mesmo deram-lhe a sua merecida dignidade e apoio.
Foram apresentados à fé
católica, batizados, receberam os outros sacramentos e puderam viver conforme
todos os homens e mulheres que vieram de outras terras para o Brasil. Até mesmo
o Paraná pôde contar com o auxílio da Igreja no cuidado dos seus índios e na
sua defesa.
Esse trabalho serviu à
informação sobre as raízes da história brasileira, bem como à conscientização
de valorizar a cultura do outro, de enxergá-la como riqueza que deve ser
respeitada. Vários povos indígenas foram dizimados, mas ainda restam sementes
de esperança em meio a realidade penosa do sofrimento indígena. Lutemos, ainda
hoje, pelos seus direitos que constantemente são ameaçados!
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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http://colegioparigot.blogspot.com.br/2011/05/18-de-maio-aniversario-de-morte-de-frei.html
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/tvmultimidia/imagens/2010/geografia/4geografia/4estreito_bering.jpg
http://luval-historiaonlineblogspotcom.blogspot.com.br
http://penta2.ufrgs.br/rgs/historia/setePovosMissoes.html
ANEXOS
ANEXO I
ANEXO II
ANEXO III
ANEXO IV
ANEXO V
ANEXO VI
ANEXO VII
ANEXO VIII
ANEXO IX
[1]
FERREIRA, Aurélio Buarque
de Holanda. Novo dicionário Aurélio da
língua portuguesa. 3.ed. Curitiba: positivo, 2004. p. 1096.
[6]
“Casual ou intencional?
Duas questões relacionadas à chegada dos portugueses à América provocam muitas
dúvidas e discussões. A primeira diz respeito aos precursores de Cabral, pois há fortes indícios de que, em 1499,
Américo Vespúcio e Vicente Pizón estiveram em terras que hoje fazem parte do
nosso território. Há suspeitas inclusive de que os próprios portugueses
aportaram aqui antes de 1500, com o navegador Duarte Pacheco Pereira. A segunda
questão tem a ver com a intencionalidade da
conquista: pretendia Cabral chegar às terras americanas ou se desviou da rota e
chegou aqui por acaso? Há argumentos a favor das duas hipóteses. Mas parece que
os portugueses, se não tinham certeza, pelo menos desconfiavam da existência
das terras americanas mesmo antes da expedição de Cabral. Caso contrário, como
se explicaria a insistência de dom João II em transferir a linha demarcatória
entre terras espanholas e portuguesas para 370 léguas a oeste de Cabo Verde,
tal e qual estabeleceu no Tratado de Tordesilhas? Além disso, o conhecimento
que os portugueses tinham dos mares, parece difícil acreditar que o acaso tenha
conduzido Cabral até a América”. ARRUDA, José Jobson de A.; PILETTI, Nelson. Toda a história: história geral e
história do Brasil. 11.ed. São Paulo: Ática, 2002. p. 186
[8]
“Caminha era um letrado. Um
homem de formação humanística, mais interessado em descrever o que via do em
calcular os lucros que o achado traria. Sua carta, portanto, é uma pequena obra
prima dentro do gênero, tão rica de informações quanto singela em suas
exposições. E, ademais, é o único documento coetâneo registrando a chegada dos
portugueses ao Brasil”. DONISETE, Luís; GUPIONI, Benzi. Índios no Brasil. 4.ed. São Paulo: Global; Brasília: MEC, 2000. p.
39.
[9]
CAMINHA, Pero Vaz de. Carta do achamento. Porto (?),
Portugal, 1450; Calecute, Índia, 15 de dezembro de 1500.
[11]
GRANDE ENCICLOPÉDIA LAROUSE
CULTURAL.v.13.São Paulo: Larousse; Nova Cultural, 1995, 1998. p. 3142.
[13]
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[14]
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Acesso em 11 de set. 2014. 20:22hs.
[16]
CUNHA, Manuela Carneiro da
(org.). História dos índios no Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, 199. p. 12.
[23]
Coivara: “Restos ou pilha
de ramagens não atingidas pela queimada, na roça à qual se deitou fogo, e que
se juntam para serem incineradas a fim de limpar o terreno e adubá-lo com as
cinzas para uma lavoura”. FERREIRA, A., op.cit.,
2004, p. 494.
[26]
THOMAS, Gerog. Política indigenista dos portugueses no
Brasil: 1500-1640. Tradução de Jesús Hortal. São Paulo: Loyola, 1981. p.
27-28.
[29]
Em troca de objetos
(pedaços de tecidos, anzóis, facas) os índios derrubavam as árvores com os
machados fornecidos pelos europeus. COTRIM, G., op.cit., 2005, p. 195.
[35]
Dia
da abolição da escravidão indígena.
Disponível em <http://alfabetanews.wordpress.com/2011/04/01/dia-da-abolicao-da-escravidao-indigena/>
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[37]
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[38]
PIERRARD, Pierre. História da Igreja. Tradução de Álvaro
Cunha. São Paulo: Paulinas, 1982. p. 197.
[41]
MARTINA, Giacomo. História da Igreja: de Lutero a nossos
dias – II: a era do absolutismo. Tradução de Orlando Soares Moreira. 2.ed. São Paulo:
Loyola, 1996. p. 319.
[43]
BIHLMEYER K.; TUECHLE, H. História da Igreja: Idade moderna.v.3.
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[47]
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Paraná: biografias de presbíteros. Curitiba: Champagnat, 2010. p. 298.
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