Trechos do livro "Jesus de Nazaré: da entrada em Jerusalém ate a ressurreição" de Bento XVI.
"'Se Cristo não ressuscitou, então é vã a nossa pregação, é vã a vossa fé. E nós aprecemos ainda como falsas testemunhas de Deus, porque contra Deus afirmamos que Ele ressuscitou Cristo' (1Cor 15, 14-15). Com essas palavras, São Paulo põe drasticamente em relevo a importância que a fé na ressurreição de Cristo tem para a mensagem cristã no seu conjunto: é o seu fundamento. A fé cristã está de pé ou cai com a verdade do testemunho segundo o qual Cristo ressuscitou dos mortos. Caso se suprima isso, certamente ainda se pode recolher da tradição cristã uma série de ideias dignas de nota sobre Deus e sobre o homem, sobre o ser do homem e sobre o seu dever ser (uma espécie de concepção religiosa do mundo), mas a fé cristã está morta. Nesse caso, Jesus é uma personalidade religiosa falida; uma personalidade que, não obstante a sua falência, continua a ser grande e pode impor-se à nossa reflexão, mas permanece numa dimensão puramente humana e a sua autoridade é válida na medida em que a sua mensagem nos convence. Ele deixa de ser o critério de medida; então o critério é apenas a nossa avaliação pessoal, que escolhe do seu patrimônio aquilo que parece útil. E isso significa que estamos abandonados a nós mesmos. A nossa avaliação pessoal é a última instância. Somente se Jesus ressuscitou aconteceu algo de verdadeiramente novo, que muda o mundo e a situação do homem. Então Ele, Jesus, torna-Se critério no qual podemos fiar-nos; porque então Deus manifestou-Se verdadeiramente". (pág. 217-218)
"É próprio do mistério de Deus agir desse modo suave. Só pouco a pouco é que Ele constrói na grande história da humanidade a sua história. Torna-Se homem, mas de modo a poder ser ignorado pelos contemporâneos, pelas forças respeitáveis da história. Padece e morre, e, como Ressuscitado, que chegar à humanidade apenas através da fé dos Seus, aos quais Se manifesta. Sem cessar, Ele bate nuavemente as portas dos nossos corações, e se Lhe abrirmos, lentamente vai-nos tornando capazes de 'ver'. Contudo, não é este precisamente o estilo divino? Não se impor pela força exterior, mas dar liberdade conceder e suscitar amor. E - pensando bem - não é o aparente mais pequenino o realmente grande? Porventura não irradia de Jesus um raio de luz que cresce ao longo dos séculos, um raio que não podia porvir de nenhum simples ser humano, um raio mediante o qual entra verdadeiramente no mundo o esplendor de Deus? Teria o anúncio do apóstolo podido encontrar fé e edificar uma comunidade universal se não operasse neles a força da verdade? Se ouvirmos as testemunhas com o coração atento e nos abrirmos aos sinais que o Senhor não cessa de autenticar as Suas testemunhas e de atestar-Se a Si mesmo, então saberemos que Ele verdadeiramente ressuscitou; Ele é o Vivente. A Ele nos entregamos, sabemos que assim caminhamos pela estrada justa. Com Tomé, metamos a nossa mão no lado traspassado de Jesus e professemos: 'Meu Senhor e meu Deus!' (Jo 20, 28)". (pág. 246-247)
"Após a multiplicação dos pães, o Senhor ordena aos discípulos que subam para a barca e partam à sua frente para a outra margem, em direção de Betsaida, enquanto Ele próprio despede a multidão. Depois, Ele retira-Se para o monte a fim de rezar. Entretanto, os discípulos estão sozinhos na barca. O vento é contrário, o mar revolto. Veem-se ameaçados pelo ímpeto das ondas e da tempestade. O Senhor parece estar longe, em oração, lá no seu monte. Mas, dado que já está junto do Pai, Ele os vê. E porque os vê, vem ter com eles, caminhando sobre o mar, sobe para a barca com eles e torna possível a travessia até a meta. Esta é uma imagem para o tempo da Igreja, destinada precisamente a nós também. O Senhor está 'sobre o monte' do Pai. Por isso Ele nos vê. Por isso pode em cada momento subir para a barca da nossa vida. Por isso sempre podemos invocá-lo e estar sempre seguros de que Ele nos vê e ns ouve. Também hoje, a barca da Igreja, com o vento contrário da história, navega através do oceano agitado do tempo. Frequentemente dá a impressão de que vai afundar. Mas o Senhor está presente, e vem no momento oportuno. 'Vou e venho a vós': esta é a confinaça dos cristãos, a razão da nossa alegria". (pág. 254-255)
"A fé no regresso de Cristo é o segundo pilar da profissão de fé cristã. Ele que Se fez carne e agora permanece Homem para sempre, que para sempre inaugurou em Deus a esfera do ser humano, chama todo o mundo a entrar nos braços abertos de Deus para que, no fim, Deus Se torne tudo em todos, e o Filho possa entregar ao Pai o mundo inteiro congregado n'Ele (cf. 1Cor 15, 20-28). Isto implica a certeza, na esperança, de que Deus enxugará todas as lágrimas; não ficará nada que seja sem sentido; toda a injustiça será superada e estabelecida a justiça. A vitória do amor será a última palavra da história do mundo. Durante o 'tempo intermediário', requer-se dos cristãos, como atitude fundamental, a vigilância. Essa vigilância significa que o homem não se fecha no momento presente, entregando-se às coisas sensíveis, mas levanta o olhar para além do momentâneo e da sua urgência. O que conta é manter livre a visão sobre Deus, para d'Ele receber o critério e a capacidade de agir de modo justo. Vigilância signifca, sobretudo, abertura ao bem, à verdade, a Deus, no meio de um mundo muitas vezes inexplicável e no meio do poder do mal. Significa que o homem procure, com todas as forças e com grande sobriedade, praticar o que é justo, vivendo não segundo os próprios desejos, mas sob a orientação da fé". (pág. 256-257)
"'E, erguendo as mãos, abençoou-os, e enquanto os abençoava, distanciou-Se deles e era elevado ao céu' (24, 50-51). Jesus parte, abençoando. Abençoando, parte; e, na benção, Ele permanece. As suas mãos continuam estendidas sobre este mundo. As mãos abeçoadoras de Cristo são como um teto que nos protege; mas ao mesmo tempo são um gesto de abertura que fende o mundo para que o Céu penetre nele e possa afirmar a sua presença. No gesto das mãos abençoadoras exprime-se a relação duradoura de Jesus com os seus discípulos, com o mundo. Enquanto parte, Ele vem levantar-nos acima dé nós mesmos e abrir o mundo a Deus. Por isso os discípulos puderam transbordar de alegria quando voltaram de Betânia para casa. Na fé, sabemos que Jesus, abençoando, tem as suas mãos estendidas sobre nós. Tal é a razão permanente da alegria cris~tã". (pág. 261)
FONTE: BENTO XVI, Papa. Jesus de Nazaré: da entrada em Jerusalém até a ressurreição. Tradução de Bruno Bastos Lins. São Paulo: Planeta do Brasil, 2011.
Comentários
Postar um comentário