DO
PROFUNDO DO NOSSO CORAÇÃO[1]
O
Cardeal Robert Sarah com a colaboração do Papa Emérito Bento XVI escreveu um
livro intitulado “Do profundo do nosso coração” que reflete sobre “o tema mais
difícil para a Igreja: o futuro dos padres, a justa definição do sacerdócio
católico e o respeito ao celibato”. A partir da leitura desse escrito,
apresento alguns pontos fundamentais da vida dos sacerdotes para que
compreendamos, sempre mais, a vida desses homens escolhidos e chamados por
Deus.
SACERDOTE: HOMEM VIGILANTE E SERVIÇAL
Diariamente precisamos
nos colocar essas perguntas: “A quem dissemos sim? Que significa ser ‘sacerdote
de Jesus Cristo’? As respostas parecem ser iluminadas por duas tarefas
descritas no Antigo Testamento (Dt 18, 5-7): estar na presença do Senhor e
servi-Lo.
“O sacerdote deve ser
alguém que vela. Deve ser vigilante em face dos poderes ameaçadores do mal. Deve
guardar o mundo desperto para Deus. Deve ser alguém que permanece em pé: reto
diante da corrente dos tempos. Reto na verdade. Reto no engajamento no serviço
do bem. Estar na presença do Senhor deve sempre significar um encarregar-se dos
homens junto ao Senhor que, por sua vez, encarrega-se de nós diante do Pai. E isso
deve significar encarregar-se do Cristo, de sua Palavra, de sua verdade, de seu
amor. O padre deve ser reto, corajoso e mesmo disposto a sofrer ultrajes pelo
Senhor”.
A vida do sacerdote é uma
vida na presença de Deus e um ministério para representação dos outros. É um
trabalho conjunto: os outros cultivam a terra, o sacerdote mantem o mundo
aberto para Deus, deve viver com o olhar voltado para Ele.
O serviço sacerdotal é a
oração, dedicar-se à presença de Deus no serviço aos irmãos. “Quando ora, o
sacerdote pode, de modo particular, reconhecer nele o cálice pelo qual o Senhor
se tornou nosso amigo no sentido mais profundo; é o Cálice da Eucaristia do
qual o próprio Senhor participa, na medida em que ele é nossa vida”.
“A vida sacerdotal na
presença de Deus se concretiza, assim, de maneira existencial graças ao
ministério eucarístico. A Eucaristia é nossa terra, ela se torna a parte que
nos cabe, aquela da qual podemos dizer: foi demarcada para mim a melhor terra e
eu exulto de alegria em minha herança (Sl 16,6)”.
“Na celebração da
Eucaristia, o que cabe ao sacerdote é servir a Deus e aos homens. O culto que o
Cristo rendeu ao Pai foi um dom de si até o fim pelos homens. É nesse culto,
nesse serviço, que o sacerdote deve se inscrever. [...] Nessa arte, não deve
haver nada de artificial. Se a liturgia é um dever central do sacerdote, isso
significa igualmente que a oração deve ser uma realidade prioritária que é
preciso aprender a cada dia de novo e sempre mais profundamente na escola do
Cristo e de seus santos de todos os tempos”.
“Os sacerdotes devem ser
pessoas que mantêm uma familiaridade com a Palavra de Deus, que a amem, e que
vivam. Servir ao Senhor – o serviço sacerdotal significa precisamente também
aprender a conhecer o Senhor em sua Palavra e fazê-la conhecer a todos que Ele
nos confia”.
“Servir significa proximidade,
exige familiaridade. Mas isso comporta um perigo: que o sagrado com o qual
estamos em contato cotidiano torne-se um hábito. De tal modo, enfraquece o
temor reverencial. Contra isso devemos lutar sem trégua, reconhecendo nossa
insuficiência e a graça que há no fato de que Ele se coloca em nossas mãos. Servir
significa proximidade, mas isso significa sobretudo obediência – ‘Que não seja
feita a minha vontade, mas a tua’ (Lc 22,42). Com essas palavras no jardim das
Oliveiras, Jesus venceu a batalha decisiva contra o peado, contra a rebelião do
coração que conheceu a queda.
Aos sacerdotes, o Papa
emérito diz: “Não nos anunciamos a nós mesmos, mas anunciamos a Deus e à sua
Palavra, que não poderíamos elaborar sozinhos. Fora da comunhão com a Igreja
que é seu corpo, não podemos anunciar a Palavra do Cristo de maneira justa. Nossa
obediência é uma maneira de crer com a Igreja, de pensar e de falar com a
Igreja, de servir com ela. Isso recobre igualmente aquilo que Jesus predisse a
Pedro: ‘Serás levado para onde não queres’. Essa maneira de nos deixarmos levar
para onde não queremos é uma dimensão essencial de nosso serviço, e é
precisamente o que nos torna livres. Assim guiados, mesmo de maneira contrária
a nossas ideias e projetos, fazemos a experiência de algo novo – a riqueza do
amor de Deus”.
No entanto, tal experiência
só se realizará em nós se formos purificados, lavados. E é Jesus quem lava
nossos pés sujos. “Ele nos torna capazes de ser comensais de Deus. Ele desceu,
e a verdadeira ascensão do homem se realiza no presente em nossa descida com
Ele e para Ele. Sua elevação é a Cruz. Estar diante Dele e servi-Lo – isso significa
no presente ouvir o seu chamado de servo de Deus”.
“Estar com Deus é afastar
aquilo que é somente o eu e se unir com a total vontade de Deus. É deixar-se
purificar por Deus, vestir as vestes sagradas. O enviado se torna um homem
novo. A única limpeza que pode realmente purificar os homens é a verdade, que é
o próprio Cristo. Devemos sem cessar sermos purificados e tomados pelo Cristo
para que seja Ele que fale e aja em nós, e cada vez menos nós mesmos. Pareceu-me
claro que esse processo que consiste em se tornar um com Ele e em renunciar
àquilo que não pertence senão a nós dura toda a vida e inclui sem cessar
liberações e renovações dolorosas”.
Lancemo-nos às novidades
de Deus!
[1] SARAH, Cardeal Robert. Do profundo do nosso coração. Tradução
de Maurício Pagotto Marsola. 1.ed. São Paulo: Edições Fons Sapientiae, 2020. p.
38-45.
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