Anselm Grun tem um pequeno
livro “Mística e eros” talvez pouco conhecido, mas de uma profundidade
inigualável na vivência religiosa da espiritualidade. O autor sugere viver “uma
espiritualidade que, em conformidade com a tradição beneditina, possa ser
‘alegria de viver’”.
Essa alegria é encontrada na
contemplação mística que cura completamente a alma, porque a convida a deixar
para trás todo pensamento, frustração e unir-se a Deus em todos os momentos: “Tudo
é bom, tudo é perpassado por Deus. Deus é”.
O caminho para Deus conduz
para um encontro decisivo: a “descida à própria realidade, à realidade do corpo
e da alma, à realidade do cotidiano com as suas fadigas, à realidade do
trabalho e da relação com as pessoas”. É a estrada da ascese interior.
Chegando ao nosso interior,
chegamos novamente a Deus e chegar a Deus é chegar “ao repouso e aqui ninguém
tem poder sobre nós. Nada nos pode inquietar, ninguém pode nos dominar. Deus é
o Deus que nos conduz para fora de qualquer prisão e dependência; é o Deus que
nos conduz do Egito para a terra da contemplação, na qual podemos ser
totalmente nós mesmos diante de nosso Deus”.
Nessa experiência encontra-se
a verdadeira liberdade do ser humano que suscita o sentimento de renovação, de
regeneração e de nascimento de um novo ser em nós. O místico experimenta em si
um novo nascimento, o nascimento de Cristo no seu coração. É o momento da
libertação das falsas auto avaliações e das identificações com o próprio ego.
A verdadeira pátria de cada um
de nós é o nosso interior. Mergulhando em nós mesmos, descobriremos que tudo no
ser humano é amor e nesse amor se encontra aquele Deus que penetra,
atravessando o mundo inteiro, e une-se a ele. Não se trata simplesmente de crer
nesse Deus, mas de tornar-se íntimo dele. A mística é a experiência do amor
divino que quer encarnar-se em nós, e que já está em nós, que se espalha pelo
nosso corpo e o vivifica.
Por vezes, deparamo-nos com a
frustração, o desânimo, a angústia e a tristeza. É o caminho árduo, mas sereno daquele
que se propõe a uma vida diferente, porque enquanto tudo vai bem não estamos em
casa. A mística é a busca do verdadeiro ser, do mistério do meu eu, portanto,
do desinstalar-se, do mover-se do fazer nascer o “eu verdadeiro”. E quando
emerge em mim o mistério do “eu sou”, também Deus nasce em mim.
Deus, o Amor, produz uma paz
profunda na alma, uma paz amorosa, um doce prazer e uma abertura ao mundo e às
pessoas. Encontramos em todo lugar as suas marcas porque Ele sempre age.
Segundo Teilhar de Chardin, “podemos tatear Deus no coração do universo”.
A mística é fidelidade à vida,
à realidade, abandonar-se a Deus que me encontra no meu trabalho, no cotidiano
e no mundo. No agir concreto, no meu modo de comer e de beber, de arrumar a
cama e trabalhar, evidencia-se a minha mística, o meu estar unido a Deus ou, ao
contrário, o meu estranhamento dele, isto é, a minha divisão interior.
O caminho místico é justamente
aquele que conduz ao cotidiano. Onde você está? Em que situação você se
encontra? De acordo com o livro de Grun, “não temos necessidade de continuar a
viver no futuro como temos vivido até agora. Liberta-te
deste modo de ver, pois mil possibilidades te convidam para uma vida nova”.
Boa aventura em si mesmo!
“Tarde Te amei, ó Beleza
tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas,
durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto,
alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… [...] Tu estavas
dentro de mim e eu fora… [...] Estavas comigo e não eu Contigo… [...] Mas Tu me
chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me
entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido.
Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo...
[...] Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. [...]
Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… [...]
Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo em
desejos por Tua Paz”.
(Santo Agostinho, Confissões
10, 27-29)
Pe. Eduardo M.
Guimarães
Reitor do Seminário Menor Diocesano Menino Deus
Chanceler do Bispado de Cornélio Procópio - PR
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
GRUN, Anselm; RIEDL, Gerhard. Mística e eros. Tradução de Sonia R. Lyra. Curitiba: Lyra Editorial, 2002.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
GRUN, Anselm; RIEDL, Gerhard. Mística e eros. Tradução de Sonia R. Lyra. Curitiba: Lyra Editorial, 2002.
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